Não sei o ano exato, mas Costa e Silva ainda amargava no poder. Foi sim um período difícil, mas posteriormente o milagre econômico traria um gole de esperança ao País. Enquanto ele não chegava, boa parte das terras tupiniquins gozava de um milagre meteorológico: chovia em agosto.
Nada que gerasse reclamações, claro, mas um burburinho tomava conta da cidadezinha no interior dos interiores de São Paulo. Ao fim da tarde, cada esquina cochichava com pouca iluminação – resquício do sol fechado pelas nuvens –, e o assunto ia findando-se à medida que ouviam o som do rádio da moça dançante aumentar, lá no campinho de futebol.
A garoa caía enquanto a menina girava, sujava-se na lama e entoava, sem preocupações com a afinação: “Tem dias que a gente se sente como quem partiu ou morreu…”, a cantoria de uma tristeza intrínseca externada pela mais bela alegria. Corria dos pingos mais grossos, ria-se até cair e rolava até uma poça. Brincava com a lama, chutava a grama, chacoalhava os cabelos negros… Ela enfadava-se facilmente das coisas; trocou a música.
“Vem, vamos embora, que esperar não é saber. Quem sabe faz a hora, não espera acontecer…”. Com o rosto tão fechado quanto o céu, a moça anunciou em silêncio o fim de sua série ritmada de passos e, também, da última tarde daquele mês oitavo. A cidade parou, os postes observavam calados.
A enxurrada estourou-se, levou seus sapatos e fê-la relembrar um passado recente. Ele, dançando na garoa de junho, chamava-a para acompanhá-lo. Ela, recatada até a alma, timidamente esperava sentada por ali. Pegou um resfriado, ficou em repouso por dois ou três dias. No último, foi procurar seu aventureiro das chuvas.
O vento opressor da ditadura levara-o para lá. Lá: um lugar nunca descoberto. “Mas eis que chega a roda-vida e carrega o destino pra lá…”